sexta-feira, 28 de maio de 2010

"A morte", por Eduardo Galeano

Nem dez pessoas iam aos últimos recitais do poeta espanhol Blas de Otero. Mas quando Blas de Otero morreu, muitos milhares de pessoas foram à homenagem fúnebre feita numa arena de touros em Madri. Ele não ficou sabendo.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Tumulto causado por liquidação deixa feridos em João Pessoa



SÃO PAULO- O primeiro dia de liquidação em uma loja de eletrodomésticos, na cidade de João Pessoa, Paraíba, causou tumulto e deixou feridos na manhã deste sábado, 22. Dez pessoas foram encaminhadas para o hospital.

Segundo a Polícia Militar, aproximadamente 5 mil clientes aguardavam a abertura da loja, quando começou a confusão. As portas foram arrombadas e todos correram para garantir sua compra. Muitos caíram e foram pisoteados.

Ambulâncias foram chamadas e prestaram o primeiro atendimento aos feridos em frente ao local. Dez pessoas precisaram ser encaminhadas a hospitais da região. Uma, com problemas cardíacos, está em estado grave. Mesmo após o tumulto, o estabelecimento comercial continuou aberto e muitos clientes fizeram suas compras normalmente.

Devido à confusão, a direção da loja anunciou que não abrirá neste domingo, 23. A promoção vai durar mais 40 dias.

Fonte: Estadão


A assustadora demonstração de consumismo desumanizador (muitas vezes apresentado como salutar efeito da economia de mercado), documentada no vídeo acima, teve como resultado a violação da integridade corporal de vítimas diversas, alguma suportando até mesmo risco de morte. Obviamente, os eventos lesivos foram provocados por pessoas que integravam a multidão delinquente (exemplo perfeito de delitos multitudinários), sendo impossível a individualização das condutas e a consequente punição dos autores. Entretanto, não há como se escapar à análise da responsabilidade criminal dos organizadores da promoção. Estes, à evidência, subestimaram o número de interessados e não prepararam uma estrutura adequada à demanda. Criaram, portanto, ainda que inadvertidamente, as condições propícias para a eclosão do fato. Assim, assumem a posição de garantidores. Acompanharei os desdobramentos dessa notícia e, se algo novo e juridicamente interessante surgir, postarei imediatamente novos comentários.

Ah, um boato espalhado na internet diz que o caso se deu em um mercado de Vitória-ES, por conta de uma promoção de batatas chips. Não se deixem enganar.

Abraços a todos.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Garantias institucionais



Isso acontece também no serviço público, especialmente quando é negada a garantia da inamovibilidade. Como, aliás, exigir eficiência e isenção em ambientes contaminados pela conveniência política?

Créditos a André Dahmer, do Malvados.

Abraços.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Cada um tem sua lista...


Em breve o técnico Dunga irá revelar seus convocados para a Copa do Mundo. Antes que ele o faça, vou divulgar meus preferidos, afinal sou um comentarista esportivo frustrado. Lá vai: Jefferson, Leandro Guerreiro, Caio... opa! Essa é a outra seleção. Vamos à lista correta:

Goleiros - Jefferson (e vocês achavam que eu o deixaria de fora?), Júlio Cesar e Fábio (do Cruzeiro);

Laterais - Maicon, Daniel Alves... hummmm... difícil... Marcelo e Nilton Santos (dane-se que ele tem 80 anos, é melhor do que esses Zé das Couves que vêm sendo cogitados);

Zagueiros - Lúcio (sou fã do jeitão desengonçado e eficiente dele), Juan, Luisão e Thiago Silva (gostara de ver Chicão, do Corinthians, no time, pois tem habilidade e é um exímio cobrador de faltas, mas aqui a concorrência é forte);

Meias - Ramires, Hernanes, Lucas, meu pai (tá velhinho mas joga bem), Elano (tem gente que não gosta, mas ele é bastante eficiente), Kaká, Ganso e Ronaldinho Gaúcho;

Atacantes - Robinho, Nilmar, Luís Fabiano e Neymar. Adriano? Matador por matador, sou mais o Maníaco do Parque, que pelo menos não enfia o pé na jaca lá na Chatuba.
_________

UPDATE: Dunga é um imbecil! Como pode deixar o Nilton Santos de fora?
UPDATE 2: Gilberto Silva, Felipe Melo, Kaká e Elano... sei não, mas acho que até o Lúcio Flávio tem uma vaga nesse meio de campo.
UPDATE 3: Grafite? Tem seleção que olha para o banco e vê o Tevez...

Debate: violação de domicílio praticada por funcionário público


Ampliando a série "debates", levanto mais um tema para discussão: se um funcionário público, no exercício da função, ingressa arbitrariamente em casa alheia, sua conduta encontrará adequação típica no art. 150, p. 2., do CP, ou na Lei 4.898/65 (ou haverá concurso de infrações penais)? Gostaria de conhecer as opiniões de todos. Aliás, podemos até ampliar o cerne da discussão: o agente público (policial, promotor etc.) que invade a casa de outrem sem motivo justo, lá encontrando, casualmente, uma situação de flagrante delito, passa a ter sua postura legitimada? E se o ingresso se dá em razão de justificada suspeita (de que um crime está sendo praticado naquele local), posteriormente não confirmada? Lembro a todos que já há outro tema para debate proposto, acerca da lei de tortura. Para acessá-lo, basta clicar no marcador "debate".

Abraços.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Lei n. 12.234 altera a prescrição penal


Foi publicada ontem a Lei n. 12.234/10, que altera os artigos 109 e 110 do código Penal e, de acordo com seu artigo 1o, visa a acabar com a prescrição retroativa. Em verdade, o diploma legal não atinge completamente seu objetivo (afinal, nossos legisladores não primam pela eficiência), pois deu-se a abolição da modalidade prescritiva APENAS NO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE O TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL (art. 111 do CP) E A DENÚNCIA, mantendo-se a a regulamentação original da causa extintiva da punibilidade no que tange aos demais marcos intrerruptivos do prazo. Ou seja, ainda é possível a prescrição retroativa, desde que se dê durante o processo. Deve ser instado que o projeto original do Dep. Antônio Carlos Biscaia previa a extinção integral da prescrição retroativa, mas o texto foi alterado durante sua tramitação. O que mais me causa espanto, todavia, é a imprecisão do legislador, ao estabelecer que não subsistirá a prescrição retroativa em data anterior à da denúncia ou queixa. Que momento é esse? O do oferecimento ou o do recebimento da peça? Pesquisando na internet alguém que pudesse me dar uma luz, deparei-me com o desabafo de Fernando Faria, que expressa algo semelhante ao que eu senti quando li a inovação legal:

"ORA, façamos o favor! Que data é essa CARA PÁLIDA? É a data do oferecimento ou do recebimento da denúncia ou queixa? Pelo visto não sabem mesmo o que fazem, certamente tiveram dias e dias para analisar e aprovar este 'textículo', e me fazem isso. Eu, com 1 minuto, pude constatar isso e confesso que não utilizei 0,5% do meu cérebro!!!

Ocorreu sim inovação. Entretanto, totalmente incongruente e desprovida de razão, é a velha máxima: 'tapar o sol com a peneira'. É bem assim que vejo esta malfadada lei. Não é assim que resolveremos o problema da criminalidade em nosso país."


De resto, cabe apenas assinalar que o prazo prescricional mínimo passou de 2 para 3 anos, o que é salutar, mas não resolve o problema dos recursos protelatórios, do assoberbamento do judiciário, do ridículo investimento nas atividades de polícia judiciária etc., etc., etc.

Segue o texto da lei:

LEI Nº 12.234, DE 5 DE MAIO DE 2010.

Altera os arts. 109 e 110 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Esta Lei altera os arts. 109 e 110 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, para excluir a prescrição retroativa.

Art. 2o Os arts. 109 e 110 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passam a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:

.............................................................................................

VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

...................................................................................” (NR)

“Art. 110. ......................................................................

§ 1o A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.

§ 2o (Revogado).” (NR)

Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 4o Revoga-se o § 2o do art. 110 do Código Penal.

Brasília, 5 de maio de 2010; 189o da Independência e 122o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto


quarta-feira, 5 de maio de 2010

Inutilidades doutrinárias


Sempre me sinto assim quando tenho que explicar a diferença entre sequestro e cárcere privado.


A imperiosa edição da lei de combate à homofobia


O reconhecimento de diretos a homossexuais é uma tendência irrefreável em nosso país, como não poderia deixar de ser, pois a opção sexual não pode criar classes diferentes de cidadãos. Trata-se do legítimo exercício da liberdade de escolha, que deve ser pleno. Entretanto, no direito penal, até mesmo por ser um ramo da ciência jurídica mais atrelado à positivação das normas (decorrência do princípio da legalidade), o tema ainda é pouco versado. Afora algumas raras menções, como a possibilidade de violência contra a mulher no âmbito de uma relação afetiva entre lésbicas, praticamente não há a tutela específica dos direitos homossexuais. Na injúria por preconceito (art. 140, p. 3., CP), por exemplo, tipifica-se a ofensa proferida em razão de nacionalidade, origem, etnia, cor de pele, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência etc., mas nada se fala acerca da preferência sexual. O mesmo se dá na Lei 7.716/89, e por aí vai. Decerto, já passou o tempo de o direito penal abrir os olhos para a realidade, desapegando-se dos dogmas religiosos que muitas vezes influenciam a atividade legislativa, especialmente no que concerne a parlamentares que esquecem a laicidade do Estado. As notícias a seguir reproduzidas servem para demonstrar a urgência do provimento legal:

"Sargento homossexual denunciará médicos militares ao Conselho de Medicina de SP

SÃO PAULO - O sargento do Exército Laci Marinho de Araújo, que foi preso depois de assumir que vivia em união homossexual com outro militar em uma entrevista em 2008, vai denunciar ao Conselho Regional de Medicina de São Paulo dez médicos militares por tortura psicológica e violações ao Código de Ética Médica. A denúncia será formalizada nesta terça-feira e pede a cassação dos profissionais de saúde.

Laci e seu companheiro, o também sargento Fernando Figueiredo, foram presos horas após darem uma entrevista a uma rede de televisão em São Paulo, em que contaram que viviam um relacionamento homossexual havia dez anos. Fernando pediu baixa da corporação. Atualmente, Laci responde em liberdade a um processo por deserção e passa por tratamento depois de ser diagnosticado por médicos particulares como portador de epilepsia do lóbo temporal, hipertensão arterial e transtorno emocional grave.

Depois de ser preso na saída da emissora de TV, Laci foi levado para o Hospital Militar do bairro de Cambuci, em São Paulo, onde, segundo Fernando, entidade de Direitos Humanos conseguiu acordo para que Laci fosse examinado por uma junta médica conjunta composta por médicos militares e civis às 8h do dia seguinte, 5 de junho de 2008. No entanto, horas antes da avaliação da junta, médicos militares deram alta a Laci e o transportaram à força para Brasília. Na capital federal, segundo Fernando, Laci foi espancado no caminho entre o hospital militar da cidade e o presídio militar.

De acordo com Fernando, a alta foi dada de maneira arbitrária, e tinha como objetivo permitir que Laci fosse transferido para Brasília, tentando conter o escândalo da divulgação da homossexualidade dos militares.

Fernando Figueiredo afirma que Laci sofreu tortura psicológica no Hospital Militar do Cambuci, além de ameaças de torturas físicas.

- Houve a ameaça de uso de amarras e de uso da violência física. Houve tortura psicológica, porque ele ficava o tempo todo cercado por mais de dez militares que ameaçavam agredi-lo caso ele não se deixasse conduzir à força para Brasília - afirma o ex-militar.

Segundo Fernando, a alta foi dada numa avaliação feita em cinco minutos, apesar de horas antes um psiquiatra da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República ter constatado que Laci tinha doença que impedia a viagem para a capital federal. Um dos médicos responsáveis pela alta já havia diagnosticado Laci como portador de transtornos emocionais graves e com quadro que apontava para esclerose múltipla em Brasília.

- Houve uma violação grave dos princípios éticos. Queremos a cassação do registro deles (os médicos do Hospital Militar de Cambuci). Sem eles, o Exército não teria conseguido fazer tudo o que fez com o Laci em Brasília. Estou confiante na decisão do Conselho de Medicina de São Paulo, porque temos provas suficientes de que eles não atuaram como médicos militares, mas como militares médicos, ou seja, atuaram primeiro como militares. Isso é inaceitável - afirma Fernando.

Uma denúncia semelhante, contra 18 médicos do Distrito Federal, foi aceita pelo Conselho Regional de Medicina da capital federal, que aguarda a defesa dos profissionais acusados por Laci.

No fim de abril, o Supremo Tribunal Federal decidiu receber recurso de Laci para que a decisão do Superior Tribunal Militar de condená-lo por deserção seja revista. O caso será analisado pela ministra Ellen Gracie, mas ainda não há data para julgamento. Enquanto espera decisão final sobre a deserção, Laci ainda é militar e trabalha num setor administrativo do Hospital Militar de Brasília. "


"Arcebispo afirma: 'A sociedade atual é pedófila'

BRASÍLIA - No primeiro dia da 48ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o arcebispo de Porto Alegre, dom Dadeus Grings, instaurou uma grande polêmica ao falar sobre as denúncias de pedofilia contra padres. Presidente da comissão responsável pelo tema principal da reunião -- a missão da Igreja no mundo -, Dom Dadeus disse que "a sociedade é pedófila". Para ele, o abuso sexual de crianças e adolescentes é mais frequente entre médicos, professores e empresários do que entre sacerdotes.

- A sociedade atual é pedófila, esse é o problema. Então, facilmente as pessoas caem nisso. E o fato de denunciar isso é um bom sinal - disse.

Dom Dadeus, de 73 anos, criticou a liberalização da sexualidade por "gerar desvios de comportamento", entre os quais a pedofilia. Para ele, assim como homossexuais conquistaram mais espaço e direitos, o mesmo poderá ocorrer com pedófilos.

- Quando a sexualidade é banalizada, é claro que isso vai atingir todos os casos. O homossexualismo é um caso. Antigamente não se falava em homossexual. E era discriminado. Quando começa a (dizer) que eles têm direitos, direitos de se manifestar publicamente, daqui a pouco vão achar os direitos dos pedófilos - disse.

O arcebispo foi escalado pela CNBB para conceder a primeira entrevista coletiva da conferência, com outros três bispos. Dom Dadeus deixou claro que o abuso sexual de crianças e adolescentes é crime e deve ser punido. Mas admitiu que a Igreja tem dificuldade de cortar a própria carne, ao lidar com denúncias contra religiosos. Segundo ele, punições internas são adotadas, mas denunciar os casos à polícia é mais complicado:

- A Igreja ir lá acusar seus próprios filhos seria um pouco estranho.

Dom Dadeus disse que, na Alemanha, apenas 0,2% dos abusos sexuais contra crianças foram praticados por sacerdotes. Ele crê que os casos de pedofilia viraram um calcanhar de Aquiles e estão servindo para quem quer atacar a Igreja e valores como a castidade:

- Há uma anomalia na sociedade humana e que deve ser corrigida. Agora, não é justo dizer que só a Igreja que tem. Não é exclusividade da Igreja. A Igreja é 0,2%.

Conhecido por suas posições conservadoras, o arcebispo afirmou que a homossexualidade é inata apenas em pequena parte dos gays. Na outra parte, segundo ele, a opção sexual é resultado da educação recebida:

- Nós sabemos que o adolescente é espontaneamente homossexual. Menino brinca com menino, menina brinca com menina. Só depois, se não houve uma boa orientação, isso se fixa. Então, a questão é: como vamos educar nossas crianças para o uso da sexualidade que seja humano e condizente?

Indagado sobre a afirmação de dom Dadeus de que a sociedade é pedófila, o arcebispo do Rio, dom Orani Tempesta, porta-voz da 48ª Assembleia, reagiu:

- É uma afirmação complicada, tem que ter dados para verificar isso. (...)"


Começo a acreditar que as Delegacias ficarão abarrotadas.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Novas súmulas do STJ em matéria penal


Transcrevo as recentíssimas Súmulas 438 a 444 do STJ, reservando outra oportunidade para comentá-las:

438: A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime.

439:
Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada. (N.A.: ver Súmula Vinculante 26 do STF)

440:
Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito.

441:
A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional.

442:
É inadmissível aplicar, no furto qualificado, pelo concurso de agentes, a majorante do roubo.

443:
O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes.

444:
Conforme orientação há muito firmada nesta Corte de Justiça, inquéritos policiais, ou mesmo ações penais em curso, não podem ser considerados como maus antecedentes ou má conduta social para exacerbar a pena-base ou fixar regime mais gravoso.

Abrangência do crime de grafitismo na lei ambiental


Durante um plantão na 12a DP (Copacabana), deparei-me com o caso de três grafiteiros detidos pela polícia militar, pois praticavam sua arte de forma não-autorizada, usando como suporte o portão de certo estabelecimento comercial. Em sua defesa, os grafiteiros alegaram que: (a) não sabiam que, no prédio, desenvolvia-se uma atividade econômica, acreditando se tratar de um imóvel abandonado (realmente dava essa impressão, pois sequer havia qualquer placa que indicasse a instalação de um comércio no local); (b) ao desenharem no portão, pretendiam retirar o espaço normalmente aproveitado por pichadores, propiciando um embelezamento do bairro; (c) não eram meros aventureiros, mas sim artistas reconhecidos, realizando várias intervenções autorizadas pelo poder público, como a pintura de trens.

Depois de alguma reflexão, entendi inexistir qualquer conduta criminosa no caso apresentado, restando somente o ilícito civil (pois a atividade não era autorizada). Para tanto, precisei buscar a exata extensão do art. 65 da Lei 9.605/98, que tem o seguinte teor: "Pichar, grafitar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano. Pena - detenção de três meses a um ano e multa. Parágrafo único. Se o ato for realizado em monumento ou coisa tombada em virtudde de seu valor artístico, arqueológico ou histórico, a pena é de seis meses e um ano de detenção, e multa". Pichar é a gravação de caracteres (normalmente letras) em espaços visíveis ao público, como uma forma de "carimbo", a fim de marcar a presença do autor no local (nada impede que sejam realizados desenhos, desde que simples - muitas vezes monocromáticos - e sem valor artístico). Grafitar significa a realização de desenhos ou pinturas com certo valor artístico, também postos em espaços visíveis ao público. Conspurcar, verbo genérico, tem a acepção de sujar ou macular, por qualquer meio.

Creio que o artigo permite uma interpretação analógica (com a permissão de Paulo Queiroz, que equipara tal técnica interpretativa à analogia - ainda preciso me aprofundar mais no tema). Ou seja, o legislador oferece fórmulas casuísticas (pichar e grafitar), para em seguida consignar a formulação genérica (conspurcar). Por conseguinte, o trecho exemplificativo da norma deve ser interpretado de acordo com o verbo genérico. Partindo desse pressuposto, só haverá crime se presente a intenção de macular o espaço urbano. Tal propósito é corriqueiramente vislumbrada na pichação (salvo em caso de desobediência civil, ou seja, de consignação de palavras de ordem em defesa de direitos constitucionalmente relevantes), mas pode ser afastada com maior facilidade no grafitismo, como no caso que me foi apresentado.

Apesar de tudo, trata-se de uma reflexão recente (ao menos para mim, já que nunca tinha pensado seriamente no tema) e aceito contribuições que conduzam a uma interpretação mais apropriada.

Em tempo: a imagem escolhida para ilustrar esse artigo é de autoria d'Os Gêmeos, artistas grafiteiros internacionalmente reconhecidos.

Abraços!

sábado, 1 de maio de 2010

Tema para debate: aplicação das excludentes da antijuridicidade ao crime de tortura

Nas aulas ministradas na graduação, tento sempre fornecer aos alunos um amplo conhecimento sobre o direito penal (apesar de saber que boa parte da matéria é sumariamente esquecida entre um período e outro), mencionando relevantes discussões doutrinárias e jurisprudenciais. Também tenho por hábito dissecar os tipos penais estudados, até mesmo alguns que normalmente não recebem a devida atenção por parte dos operadores do direito. Todavia, dada a extensão do conteúdo programático, resta pouquíssimo tempo para debates mais aprofundados sobre temas instigantes: ou seja, falta obrigar o aluno a pensar, ao invés de repetir mecanicamente o que foi absorvido em sala de aula. Portanto, a partir de agora inauguro aqui no blog um espaço para debates, convidando todos os alunos a participarem (como sei que muitas vezes é preciso dar um estímulo à participação, darei 0,5 pt na média do semestre CASO HAJA CONTRIBUIÇÕES FREQUENTES E RELEVANTES - eu sei, estou tentando comprar os alunos, quando deveria acreditar na espontaneidade, mas dane-se, controlo o blog de maneira ditatorial, as regras são minhas). Inicialmente, gostaria de discutir o tema da tortura, até porque está na ordem do dia. O questionamento que se faz é: a tortura admite causas de justificação? Mãos à obra!

Abraços a todos.