segunda-feira, 25 de julho de 2011

Lesão corporal no esporte

"Jogador do Vasco leva voadora pelas costas e vai para o hospital em jogo de juniores - Futebol - UOL Esporte


"Durante uma briga entre jogadores do Sport e do Vasco, em partida válida pela Taça Belo Horizonte de Juniores, o goleiro Gustavo, do time pernambucano, aplicou uma voadora pelas costas em Elivelton, da equipe carioca. O impacto da agressão no pescoço fez com que o jovem atleta desmaiasse.

Elivelton foi levado às pressas para o hospital municipal na cidade de Barão de Cocais, em Minas Gerais. As primeiras informações dão conta de que o vascaíno está consciente, caminhando e conversando, e não foi constatada nenhuma anormalidade.

'Clinicamente ele está estável. O exame de raio-X não apresentou nenhuma lesão óssea', informou ao UOL Esporte o médico do Vasco, Vitor Pereira Alfradique. Elivelton passará a noite no hospital e na manhã desta terça-feira será transferido para a cidade de Itabira para novos exames.

O Sport divulgou que Gustavo foi demitido. 'Por conta da atitude tão desmedida, o arqueiro foi afastado do clube.'

Após a voadora, iniciou-se uma briga generalizada no campo e o árbitro encerrou a partida, vencida pelo Vasco por 3 a 1.

'Não deu para conversar com ele. Ele estava no chão, fica a preocupação, é um amigo, um companheiro. Foi uma covardia, uma atitude desumana, esse rapaz [Gustavo] tem que ser banido do futebol. O menino corre o risco de terminar em uma cadeira de rodas', declarou Morano, atleta do time cruzmaltino, em entrevista à Sportv.

Os próprios membros da delegação do Sport reprovaram o ato e pediram desculpas aos vascaínos no gramado.

'Tudo começou com uma falta, e não tinha motivo para uma briga dessa dimensão. Aí começaram agressões inúteis, e acabou assim, com o menino na ambulância. Agora esperamos receber notícias boas do médico para tranquilizar a família dele [Elivelton]', completou Morano."


Não há dúvidas de que, nesse caso, é possível a incidência do Direito Penal (em princípio, o crime é de lesão corporal leve, embora a confirmação dependa de exames médicos e periciais complementares). Nas competições esportivas, ou mesmo nas atividades de lazer, é comum que os praticantes suportem as mais diversas lesões, mormente nos esportes "de contato". Desde que sejam causadas dentro das regras do esporte (socos em lutas de boxe, golpes permitidos de artes marciais etc.) ou que se caracterizem como desdobramentos naturais da atividade (por exemplo, faltas no futebol, acidentes automobilísticos em manobras arriscadas), não existe crime, pois a conduta é materialmente atípica (não há a criação de riscos proibidos). No evento em apreço, contudo, a agressão extrapola os limites da razoabilidade e da normalidade, possuindo nítido caráter criminoso.

Abraços a todos.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Teoria do erro aplicada 2 (se é que houve erro...)


"Mulher atira em cachorro que ameaçava seus filhos e mata marido por acidente"

Fonte: UOL

"A polícia do Mississippi, nos Estados Unidos, afirma que uma mulher abriu fogo em um cachorro que, supostamente, estaria ameaçando seus filhos. No entanto, Betty Walker errou o tiro e acabou acertando e mantando seu marido.

Testemunhas disseram à polícia que o pitbull chamado Cocaine (cocaína, em inglês) avançou sobre os filhos de Betty, na sexta-feira (15), e quase os mordeu.

As crianças correram para dentro de casa e o pai delas foi atrás do cachorro e conseguiu pegá-lo no colo. Em seguida, Betty deu dois tiros, um atingiu o cachorro e o outro pegou em cheio no peito do marido, Robert Walker, de 53 anos.

A porta-voz do condado de Jackson, Colendula Green, disse que a morte de Walker foi, aparentemente, acidental.

Um júri irá decidr se Betty responderá ou não processo por homicídio.

O centro de zoonoses da cidade recolheu o cachorro. O dono do pitbull poderá ser processado."


Bom, em princípio, a notícia aparenta versar sobre estado de necessidade, ao qual se sucede um resultado diverso do pretendido. Afinal, havia crianças em situação de perigo atual e, em defesa delas, a mãe disparou contra o cachorro, errando o alvo e acertando o próprio marido, o qual faleceu. Fosse apenas isso, estaria ela isenta de qualquer responsabilização criminal. Entretanto, a notícia é um pouco mais complexa.

Primeiramente, deve ser avaliado se realmente incidia, sobre o caso concreto, a causa de justificação. Segundo a reportagem, depois que foram atacadas pelo cachorro, as crianças conseguiram se abrigar em casa, arrostando a situação de risco. Em seguida, seu pai foi ao encontro do animal, iniciando uma linha de eventos diversa da original. Ou seja, a segunda situação de risco (deixa eu ver se entendi bem... o cara pegou um pitbull no colo?!), suportada pelo pai, foi criada por ele. Evidentemente, tal atitude pode ter sido motivada para garantir a segurança de outros transeuntes, mas não há nada no texto que permita seja inferido novo estado de necessidade.

Nesse contexto, a despeito da autocolocação da vítima em perigo, o disparo de arma de fogo também pode ser considerado excessivo. Ora, a razoabilidade recomenda que, em tais situações, deva ser acionado o Corpo de Bombeiros, ou qualquer outro órgão cujos agentes tenham treinamento para resolver o caso. E depois, uma vez contido o animal pela vítima, o tiro se mostra desnecessário. O confronto pessoal com o cão e seu desfecho, destarte, não eram o meio menos lesivo dentre as opções existentes.

Ao disparar, portanto, a mulher não agia (pelo menos de acordo com as informações fornecidas) acobertada por uma justificante. E, ao errar, provocou um resultado diferente daquele que pretendia produzir (bom, ela atirou em um animal que estava no colo do marido, ou seja, ou tem um déficit intelectivo - o que levanta a questão de como ela conseguiu sobreviver até aqui -, ou realmente queria matá-lo - mas, como a polícia americana tratou o caso como acidente, eles devem ter suas razões). Não há que se falar em erro na execução, pois não existia uma relação "pessoa-pessoa", mas sim "coisa-pessoa", com resultado duplo. Assim, a mulher, ao menos no Brasil, deveria responder por maus-tratos contra animais, cumulado com homicídio culposo.

Tratando-se de um caso peculiar, aceito teses contrárias à minha. Mãos à obra. Abraços a todos.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Subsidiariedade e fragmentariedade são para os fracos!

Para aqueles que acham que o Brasil é a meca do direito penal hipertrofiado:

Parlamento do Maláui quer proibir peidos em público - 04/02/2011 - UOL Tabloide

O Parlamento do Maláui prevê restaurar uma lei colonial que proibia emitir peidos em público, indicou nesta sexta-feira o ministro da Justiça e de Assuntos Constitucionais, George Chaponda.

"O governo tem o direito de manter a decência pública", declarou Chaponda à rádio independente Capital Radio. "Temos que impor a odem", insistiu. "Por acaso querem que as pessoas soltem peidos em qualquer lugar?"

Segundo o ministro, "agora e devido ao multipartidarismo e à liberdade, as pessoas se acham no direito de se soltar em qualquer lugar".

"Isso não ocorria durante a ditadura (de Kamuzu Banda, da independência em 1964 a 1994), porque as pessoas temiam as consequências", explicou.

"As necessidades da natureza podem ser controladas (...). Os malauianos podem muito bem ir ao banheiro ao invés de soltar peidos em público", insistiu.

Segundo o ministro, o Parlamento examinará na próxima semana uma emenda que prevê qualificar os peidos em público como "delito menor", passível de uma multa.

"Deixemos que os deputados decidam", comentou o ministro da Justiça.

Nenhum malauiano foi condenado em virtude da lei de 1929 promulgada durante a época em que Maláui era uma colônia britânica.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

A fiança está de volta « BLOG DO VLAD

Texto publicado no blog do Procurador da República Vladmir Aras, que ora reproduzo por sua pertinência:

"A Lei 12.403/2011, que alterou o Código de Processo Penal, pode ter muitos defeitos, mas a disciplina da fiança não é um deles. Vozes agourentas vaticinavam que a lei produziria uma catástrofe em termos de segurança pública, que não ocorreu e acho que não ocorrerá. Convenhamos… Pior do que está é difícil ficar.

Com a nova lei, que entrou em vigor em 4/jul, muitos temiam a soltura de dezenas de milhares de criminosos perigosos em todo o Brasil, tendo em vista o maior rigor para a decretação ou manutenção de prisões preventivas, que são prisões cautelares determinadas pelos juízes antes do julgamento da causa. Servem para garantia da ordem pública, da ordem econômica, para assegurar a aplicação da lei penal ou por conveniência da instrução criminal (art. 312, CPP). Agora também pode-se decretar a prisão preventiva em caso de descumprimento das novas medidas cautelares pessoais (art. 282, §4º, CPP).

A reformulação da prisão preventiva é inovação que considero constitucional e razoável. Este tipo de prisão deve ser mesmo uma medida excepcional, reservada para casos graves, para situações de recalcitrância do réu ou de ofensa a interesses processuais relevantes. A preventiva não é paliativo para a morosidade da Justiça criminal e não serve para antecipar a punição de culpados. Se a Polícia, o Ministério Público e o Judiciário agissem – ou tivessem condições de agir – de forma mais célere e se não houvesse tantos abusos propiciados por recursos defensivos que não acabam nunca, as decisões finais, condenatórias ou não, chegariam a tempo de atender às legítimas aspirações da sociedade, da vítima e de seus familiares. Mas tudo demora tanto, às vezes décadas, que a prisão preventiva passou a ser usada por alguns como antecipação da punição penal, o que não é o seu propósito.

Além de tocar neste ponto relevante, a reforma processual de jul/2011 trouxe uma série de novas medidas cautelares penais. Algumas não são tão novas assim, já sendo previstas, com outra formatação ou finalidade, na Lei das Execuções Penais (Lei 7.210/84) ou na Lei dos Juizados Especiais (Lei 9.099/95). Outras são antigas como as múmias do Egito, mas, como estas, estavam mortinhas da silva.

É o caso da fiança. Revigorada pelo art. 319, inciso VIII, do CPP, a fiança agora serve “para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial“. Segundo o §1º do art. 319, esta garantia pode ser cumulada com outras medidas cautelares.

A volta da fiança ao lugar que lhe pertencia (e que foi perdendo paulatinamente a partir da Lei 6.416/1977) já pode ser vista no cotidiano forense, inclusive num caso bastante triste. No sábado, 9/jul, um acidente de trânsito em São Paulo tirou a vida da advogada Carolina Cintra Santos. Carolina foi minha aluna por dois semestres no Centro Universitário Jorge Amado, aqui em Salvador.

A vítima dirigia seu carro no bairro do Itaim, na capital paulista, quando teria ultrapassado devagar um sinal vermelho, coisa que quase todo mundo faz ao volante, para evitar assaltos na noite das violentas cidades brasileiras. Era madrugada e a vítima estava sozinha. Subitamente, seu veículo foi colhido por um bólido. A estimados 150 km/h, um Porsche pilotado pelo engenheiro M. M. A. L., atingiu o carro da vítima, destruindo-o e matando-a.

A Polícia Civil de São Paulo o indiciou por homicídio com dolo eventual (art. 121 do CP). Entendeu que, ao conduzir um carro àquela velocidade, em zona urbana, o motorista assumiu o risco de produzir a morte de alguém. A pena para este crime é de 6 a 20 anos de reclusão. A alternativa seria a realização do flagrante pelo crime de homicídio culposo no trânsito, cuja sanção é de meros 2 a 4 anos de detenção (art. 302 do Código de Trânsito). Caberá à Promotoria de Justiça imputar ao motorista um ou outro delito. Eventual culpa concorrente da vítima, não impede a persecução criminal.

Mais do que depressa, a defesa ingressou com pedido de liberdade provisória. Antes da Lei 12.403/11, é muito provável que o causador do acidente saísse livre, sem garantia alguma (antigo art. 310, parágrafo único). Agora não. A juíza Ana Carolina Della Latta Camargo Belmudes estipulou fiança de 300 mil reais e proibiu o engenheiro M.M.A.L. de frequentar bares e casas noturnas (suspeita-se que estava bêbado ao volante) e de deixar a cidade sem autorização judicial. A magistrada também impôs a medida de recolhimento domiciliar noturno e lhe proibiu viagens para fora do País.

Todas essas medidas cautelares estão previstas na nova lei e já integram os arts. 319 e 320 do CPP:

a) proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações (art. 319, inciso II)

b) proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução (inciso IV)

c) recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos (inciso V)

d) proibição de ausentar-se do País, com entrega do passaporte (art. 320)

Isto só foi possível porque o CPP – modificado pela Lei 12.403/11 - deu nova força à fiança, tornou-a medida cautelar autônoma e atualizou os seus valores, que eram irrisórios e inaplicáveis. Só para comparar, quando foi preso sob suspeita de estupro, o ex-diretor do FMI, Dominique Strauss-Kahn pagou fiança de US$ 1 milhão. Quando acusado de pedofilia, o cantor Michael Jackson foi solto após pagar fiança de US$3 milhões. Isto era impensável no Brasil, devido à falha legislativa de 1977, ao equívoco do constituinte de 1988 e à leniência dos tribunais.

Agora, os juízes brasileiros podem arbitrar fiança entre 1/3 do salário mínimo e 200.000 salários mínimos, o que estabelece uma faixa de valores que hoje vai de 181,66 reais a 109 milhões de reais, dependendo da gravidade objetiva do crime, da situação econômica do acusado, de sua vida pregressa e periculosidade. Se pode ser aumentada até a casa dos milhões, a fiança também pode ser dispensada em caso de miserabilidade. Pode ser aplicada isolada ou cumulativamente. Pode substituir a prisão ou por ela ser substituída.

Assim postos os limites do instituto, vemos que o valor estabelecido pela juíza paulistana foi até baixo. Mas sua conjugação com outras medidas cautelares parece reparar esta aparente falha de estimativa. O fato é que, rapidamente, o suspeito pagou a fiança e poderá defender-se livre, da denúncia que vier a ser formulada pelo Ministério Público de São Paulo, ficando resguardada até o final a sua presunção de inocência.

A nova lei não será capaz de diminuir os índices de criminalidade, nem de reduzir a dor da família de Carolina Cintra Santos e de outras tantas vítimas deste tipo e de outros tipos de violência. Pelo menos, esta nova minirreforma (a quarta desde 2008) aperfeiçoa o processo penal de 1941, restabelece uma importante ferramenta de garantias bilaterais e cria algumas – nem todas – alternativas eficazes à prisão provisória, a exemplo do monitoramento eletrônico e da suspensão do exercício de função ou atividade.

Enfim, a liberdade provisória com fiança está de volta ao tabuleiro processual. Esperemos que a confiança na Justiça comece a voltar também."


Abraços a todos.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Dica de filme: Robin Hood, de Ridley Scott


Acabei agora de ver Robin Hood (a versão mais recente, com Russell Crowe e Cate Blanchett). Apesar da mistura entre lenda e realidade (e esta ainda é um tanto romanceada), é um ponto de partida muito interessante para aqueles que desejam saber mais sobre o início da monarquia constitucional na Inglaterra, com a edição da Magna Carta de 1215, imposta pela revolta dos barões ingleses. Recomendo.

Abraços a todos.