quarta-feira, 4 de julho de 2012

Para reflexão: texto do Promotor de Justiça Alexandre Joppert sobre a descriminalização do uso de drogas


Concorde-se ou não com a opinião a seguir exposta, é fato que a excelência do texto merece uma leitura atenta. Em tempo: a publicação foi autorizada pelo autor. Vamos a ele:

"DESCRIMINALIZAÇÃO DAS DROGAS NO BRASIL: EPOPÉIA DA INGENUIDADE

No momento em que ganha corpo a campanha para a descriminalização do porte para consumo pessoal de drogas, tal como se essa medida fosse idônea à diminuir o endêmico problema que devasta a sociedade brasileira, sobretudo nas classes mais pobres e vulneráveis, resolvi escrever algumas palavras que visam contrariar as opiniões ingênuas e argumentos “politicamentes corretos” de alguns defensores da ideia.

E dentro desse enfoque, é necessário inicialmente adjetivar como falaciosa a afirmativa de que “lugar de consumidor de drogas não é na cadeia”, como se a lei atual brasileira impingisse ao usuário pena privativa de liberdade. 

Nada mais equivocado. 

Isso porque a lei 11.343 (Lei antidrogas), em seu art. 28, simplesmente não prevê pena de prisão para o caso, mas sim medidas alternativas que vão desde a simples advertência, passando por obrigação de freqüência de cursos e palestras, até a multa.

Todavia, ainda que tímidas e ineficazes, ao menos existem sanções cominadas àquele que porta ou possui drogas para uso pessoal, dando um recado para toda sociedade que esta conduta além de típica é antijurídica, ou seja, contrária ao ordenamento jurídico. 

Agora, simplesmente descriminalizar as condutas do usuário é o mesmo que, obviamente, incutir no consciente coletivo de que esta conduta passaria a ser permitida. As cracolândias, que se alastram pelo país, virariam território de ninguém. Andar livremente pelas ruas e parques fumando maconha seria tido como lícito. Cheirar cocaína na recepção de um cinema de um filme infantil nada renderia na ordem punitiva.

Alguém duvida que o consumo de drogas explodiria no Brasil? Alguém teria a inocência de acreditar que o país, que a passos lentos vem, somente agora, conseguindo refrear o consumo de álcool ao volante, experimentaria um substancial derramamento de sangue por veículos conduzidos por pessoas drogadas? E a violência que vem por trás das drogas? Hoje, um por cento da população brasileira é dependente do crack. No entanto, trinta e cinco por cento dos homicídios no Brasil estão ligados ao consumo desta arrasadora droga. Alguém tem dúvidas sobre o aumento colossal dos crimes violentos com a liberação do crack, do oxi e outras drogas pesadas? Qual o ingênuo que sinceramente crê que a legalização das drogas injetáveis não irá levar à estratosfera os índices de transmissão de HIV?

A ausência de respostas realmente plausíveis para essas indagações já seria suficiente para encerrar a celuma. Mas há muito mais a ser dito.

Veja-se o caso da maconha, droga "glamourizada" pelos defensores da descriminalização, e que, no entanto, possui efeitos bastante danosos. Ela pode bloquear receptores neurais muito importantes, causando ansiedade, perda de memória, alienação, depressão e surtos psicóticos. E além de seus inequívocos malefícios é, frequentemente, a porta de entrada para outras drogas. Sinceramente, ao menos com a vista desarmada não há como entender esse recorrente empenho de descriminalização. 

Em sua essência, a quem se pretende beneficiar com a tresloucada medida?

Caso adotássemos os princípios defendidos pelos lobistas da liberação, o Brasil estaria entrando, com o corriqueiro atraso, na desastrosa experiência européia, sobretudo em Portugal e Espanha, onde explodiram os índices de dependência química e do tráfico de drogas após a flexibilização de suas respectivas legislações penais. Além disso, a Holanda, que foi pioneira em autorizar a abertura de cafés onde era permitido consumir maconha e haxixe, já está consertando essa equivocada política. O mesmo ocorre na Suíça, que também está voltando atrás na liberação de espaços em que viciados se encontravam para injetar heroína fornecida pelo próprio governo, e que se transformaram em território livre de zumbis praticantes de crimes de toda ordem. Isso tudo sem falar na Suécia, que nas décadas de 60 e 70 foi o primeiro país no mundo a tratar de forma não penal a questão do usuário, e que hoje, dado ao evidente erro dessa política, é o país com o tratamento penal mais rigoroso ao usuário em toda a Europa.

Some-se a isso uma pergunta que não quer calar: Ao legalizar o consumo de drogas, de quem o usuário irá adquirir seu produto? 

Será que os grandes cartéis de narcotráfico forneceriam ao governo a maconha, o crack, a cocaína e todas as demais drogas que seriam repassadas aos usuários? 

Todos, menos os bucólicos entusiastas da “liberalidade”, sabem que não há meia dependência. É raro encontrar um consumidor ocasional. Existe, sim, usuário iniciante, mas que, muito cedo, transforma-se em dependente crônico. Afinal, a compulsão é a principal característica do adicto. Um cigarro da “inofensiva” maconha preconizada pelos araustos da descriminalização pode ser o passaporte para uma overdose de heroína. 

Não estou falando de teorias, mas da realidade cotidiana e dramática de muitos usuários, que destroem não só suas vidas, perdem seus empregos, arrasam a estrutura de suas famílias, e não raro se enveredam para o mundo dos crimes violentos. 

Enquanto os “filósofos e intelectuais” professam suas liberais preleções, as drogas seguem matando a juventude e enriquecendo ainda mais o narcotráfico. A dependência por uso de drogas não admite discursos infantis, mas ações firmes e investimentos na prevenção e recuperação de usuários, ao lado de uma mínima intimidação por parte do Direito Penal, sob pena de aniquilamento das gerações futuras.

Esse é meu humilde ponto de vista sobre a questão."

Um comentário:

  1. Penso exatamente como o Joppert. Acrescento que diferente da Suécia, Holanda e Suíça, temos uma das piores estruturas do mundo no que diz respeito à saúde pública. Como iríamos dar conta de tantos novos dependentes com a liberação?

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