segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Subtração de veículo e "furto de uso": análise de caso concreto


"Jovem furta van, entra pela contramão e bate em três carros em Copacabana"

RIO - O jovem Diogo Taboada Costa Gonçalves, de 26 anos, furtou uma van e colidiu contra três carros que estavam estacionados, ao entrar pela contramão da Rua Tonelero, uma das mais movimentadas de Copacabana, na madrugada deste domingo. Com o impacto da batida, um dos veículos capotou. Ninguém se feriu.

De acordo com agentes que se preparavam para montar uma blitz da Operação Lei Seca e que foram acionados por moradores, o rapaz apresentava sinais de embriaguez. Diogo contou aos agentes que mora em Copacabana e havia acabado de sair de uma festa, no mesmo bairro.

Segundo a equipe da operação, o motorista da van, linha Copacabana-São Conrado, estacionou o veículo na esquina com a Rua Anita Graribaldi para tomar um café, mas não trancou as portas e deixou a chave dentro da van. Diogo entrou no coletivo e seguiu pela contramão da rua. Perdeu a direção, bateu num Celta, num Peugeot 206 e contra uma Saveiro, que virou. A van ainda atingiu e danificou o portão de um edifício.

Diogo foi levado para a 12ªDP (Copacabana), onde o caso foi registrado."

Fonte: O Globo online, 30/08/2010


Sou suspeito para falar desse caso. A avaliação jurídico-penal da conduta foi feita pelo Delegado Daniel Mayr. As entrevistas posteriores foram concedidas pelos Delegados Daniela Terra e Antenor Martins. Todos grandes amigos. Além disso, trabalho na 12a DP (Leme), onde o caso foi registrado. Ainda assim, pretendo comentar o acerto da não autuação do motorista pelo crime de furto.

A discussão versa sobre o animus rem sibi habendi, associado ao animus domini, que devem nortear a conduta do sujeito ativo na maioria dos crimes patrimoniais. O primeiro elemento subjetivo se refere à intenção de haver a coisa contra a vontade do titular do direito real sobre o bem (subtração invito domino), ao passo que o segundo trata da vontade de incorporar o bem ao patrimônio próprio ou alheio. Inexistindo qualquer uma dessas elementares, não há que se falar em furto (caracterizando-se a figura atípica do "furto de uso").

Costuma-se afirmar, doutrinariamente, que o "furto de uso" não resta delineado quando a coisa é destruída ou seriamente danificada durante o evento. Isso ocorre porque, no mais das vezes, tal particularidade dificulta que se enxergue a intenção de restituir o bem. Todavia, não é o evento lesivo que faz surgir o animus domini, circunstância de caráter puramente psicológico, dissociado, portanto, das demais circunstâncias objetivas do caso. Assim, se a ausência da intenção de haver a coisa para si ou para outrem puder ser demonstrada por outros indícios (como a prova testemunhal), a questão se resolve na responsabilidade puramente civil.

Por conseguinte, no que concerne ao aspecto patrimonial do delito, mostra-se irretocável a opção esposada pela Autoridade Policial no caso em apreço.

Em tempo: sequer há que se falar no furto do combustível, por sua insignificância.

Abraços a todos.

Um comentário:

  1. Oi Professor,
    Ótimo caso concreto, ficou bem claro em que não há que se falar de furto.
    No entanto o agente irá responder na área civil pelo danos causados nos demais veículos e no edifício?
    E se houvessem vítimas fatais como seria resolvido?

    Obrigada!

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