Matéria veiculada no site do Jornal Extra, publicada em 19/08/2010, noticia que policiais militares lotados nas UPPs instaladas pelo Estado serão transformados em mediadores de conflitos comunitários, buscando a pacificação de casos comezinhos, como discussões entre vizinhos e hipóteses afins. Para tanto, serão capacitados pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Creio que tal iniciativa, apesar de pautada por nobre intenção (fazer com que o poder público ocupe um vácuo deixado pelas organizações criminosas na atividade de dirimir celeumas), é perigosa, pois coloca o policial militar no limiar da usurpação de função. Explica-se: a polícia militar é composta por profissionais especializados em técnicas de policiamento ostensivo (devo dizer, a propósito, que a capacidade operacional da PM, ao menos no RJ, impressiona pela qualidade), mas nem sempre conhecedores dos meandros do direito penal. E as "feijoadas" (gíria para as confusões generalizadas oriundas de motivos risíveis), principal objeto da futura atuação das UPPs, costumeiramente deságuam na prática de infrações penais, ainda que de menor potencial ofensivo (crimes contra a honra, lesões corporais etc.). Tais casos, obrigatoriamente, devem ser avaliados pela Autoridade Policial (Delegado de Polícia), para que seja dada a correta classificação jurídico-penal da conduta. Afinal, nem sempre as fronteiras entre a conduta atípica, uma lesão corporal, um ato de violência doméstica, ou mesmo a tentativa de homicídio, por exemplo, são bem delineadas (muitas vezes são sobremaneira tênues). Nem se fale que os delitos de menor potencial ofensivo são de processamento condicionado à manifestação de vontade do ofendido, permitindo a composição entre as partes. Contrariando o senso comum, muitas destas infrações são de ação pública incondicionada, como o constrangimento ilegal e a violação de domicílio.
A sitação, tal qual criada, assemelha-se muito ao termo circunstanciado lavrado pela polícia militar, admitido em alguns estados-membros, mas já rechaçado pela jurisprudência majoritária (inclusive nos tribunais superiores), uma excrescência que deve ser banida pelo ordenamento jurídico pátrio. Escrevi sobre o tema em um livro, em trecho ora reproduzido:
O livro, uma obra coletiva, se chama "Exame da OAB" e é um de meus trabalhos mais obscuros (apesar do bom número de exemplares vendidos), pois fui chamado a participar na última hora, escrevendo toda a parte referente à investigação pré-processual. Apesar disso (e de seu direcionamento à prova da OAB), é um bom livro, que eu recomendo.
Gostaria de saber opiniões sobre o tema, favoráveis ou contrárias (só não vale xingar). Alguém se habilita?
Abraços a todos.
Creio que tal iniciativa, apesar de pautada por nobre intenção (fazer com que o poder público ocupe um vácuo deixado pelas organizações criminosas na atividade de dirimir celeumas), é perigosa, pois coloca o policial militar no limiar da usurpação de função. Explica-se: a polícia militar é composta por profissionais especializados em técnicas de policiamento ostensivo (devo dizer, a propósito, que a capacidade operacional da PM, ao menos no RJ, impressiona pela qualidade), mas nem sempre conhecedores dos meandros do direito penal. E as "feijoadas" (gíria para as confusões generalizadas oriundas de motivos risíveis), principal objeto da futura atuação das UPPs, costumeiramente deságuam na prática de infrações penais, ainda que de menor potencial ofensivo (crimes contra a honra, lesões corporais etc.). Tais casos, obrigatoriamente, devem ser avaliados pela Autoridade Policial (Delegado de Polícia), para que seja dada a correta classificação jurídico-penal da conduta. Afinal, nem sempre as fronteiras entre a conduta atípica, uma lesão corporal, um ato de violência doméstica, ou mesmo a tentativa de homicídio, por exemplo, são bem delineadas (muitas vezes são sobremaneira tênues). Nem se fale que os delitos de menor potencial ofensivo são de processamento condicionado à manifestação de vontade do ofendido, permitindo a composição entre as partes. Contrariando o senso comum, muitas destas infrações são de ação pública incondicionada, como o constrangimento ilegal e a violação de domicílio.
A sitação, tal qual criada, assemelha-se muito ao termo circunstanciado lavrado pela polícia militar, admitido em alguns estados-membros, mas já rechaçado pela jurisprudência majoritária (inclusive nos tribunais superiores), uma excrescência que deve ser banida pelo ordenamento jurídico pátrio. Escrevi sobre o tema em um livro, em trecho ora reproduzido:
"(...) Há que se consignar, ainda, que também o termo circunstanciado (procedimento lavrado nas infrações de menor potencial ofensivo) deve ser presidido por autoridade policial. Alguns Estados, tendo em vista o acúmulo de trabalho em Delegacias de Polícia, instituíram a atribuição da Polícia Militar para a formalização de termos circunstanciados, o que nos parece de todo equivocado, já que as atribuições deste órgão são perfeitamente delimitadas na Constituição Federal (artigo 144, § 5º), nelas não se incluindo os atos de investigação, salvo em caso de infrações militares. Sobre o assunto, manifestou-se recentemente o STF, na ADIn 3614, na qual foi declarado inconstitucional (vencido o Min. Gilmar Mendes) o Dec. nº 1.557, do Estado do Paraná, que atribuía a subtenentes e sargentos da Polícia Militar atendimento nas Delegacias de Polícia, nos Municípios que não contassem com Delegado de carreira. No bojo do diploma, encontrava-se o artigo 5º (que estabelecia a atribuição da PM para lavrar termos circunstanciados), também fulminado pelo vício da inconstitucionalidade."
O livro, uma obra coletiva, se chama "Exame da OAB" e é um de meus trabalhos mais obscuros (apesar do bom número de exemplares vendidos), pois fui chamado a participar na última hora, escrevendo toda a parte referente à investigação pré-processual. Apesar disso (e de seu direcionamento à prova da OAB), é um bom livro, que eu recomendo.
Gostaria de saber opiniões sobre o tema, favoráveis ou contrárias (só não vale xingar). Alguém se habilita?
Abraços a todos.
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