sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Explosão do Restaurante Filé Carioca: enquadramento típico

As estarrecedoras imagens da explosão ocorrida em um restaurante no Centro do Rio de Janeiro, que matou três pessoas e feriu dezessete, nada mais são do que aquilo que Gabriel García Marques alhures chamou de "crônica de uma morte anunciada": a precária, para não dizer inexistente, fiscalização do poder público, associada a licenças "provisórias", que nada mais são do que um jeitinho de permitir o funcionamento de estabelecimentos inadequados, além de corriqueira fonte de recursos ilícitos que alimentam a corrupção, decerto foram fatores decisivos para a tragédia. Evidentemente, não se busca, aqui, o afastamento da responsabilidade penal do proprietário do restaurante, mas é evidente que os agentes públicos que fizeram vista grossa para a irregularidade, seja por qual motivo, se identificados (o que é improvável), deveriam também ser penalmente imputados. Mas qual seria a tipificação adequada para o caso em apreço?


Não tenho dúvidas em afirmar a existência de crime de explosão culposa, com resultado morte também culposo (artigo 251, p. 3., c/c artigo 258, ambos do Código Penal). Certamente, o proprietário do estabelecimento não tinha o objetivo de ver sem empreendimento voando pelos ares, apesar da imprudência em instalar botijões de gás em local fechado, propiciando o surgimento de bolsões em caso de vazamento. Portanto, creio não haver se falar em dolo indireto (eventual). Não houve assunção do risco de se produzir a explosão, razão pela qual o crime de perigo surge na modalidade culposa. No que concerne aos resultados lesivos (lesão corporal leve, grave e morte), as lesões leves são absorvidas pela própria explosão. Ainda assim, restam as lesões graves e as mortes. Ajusta-se ao fato o disposto no artigo 258 do Código Penal, no qual apenas uma das mortes servirá para incrementar a pena. Os demais resultados serão avaliados pelo Juiz da causa quando da fixação da pena-base (artigo 59 do Código Penal).

Insta salientar, ainda, que a Lei n. 8.176/90 prevê condutas criminosas que tratam do uso inadequado de gás liquefeito de petróleo (artigo1.o, II), mas não versa sobre seu uso em restaurantes e estabelecimentos congêneres, impedindo a aplicação do referido diploma.

5 comentários:

  1. E o concurso formal, não entra na tipificação do fato?

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  2. Não, não há concurso formal na hipótese, mas meramente um crime culposo com resultado especialmente agravador, também na forma culposa.

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  3. OK Bruno, obrigado pelo esclarecimento.

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  4. É o que a professora claudia bastos cita como crime de perigo culposo com resultado de dano culposo; se o tipo nao prevesse o resultado culposo, poderia se pensar em homicidio. a quantidade de pessoas mortas serviria pra fixação da pena, acho eu.

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  5. É isso aí, Marcelo. Nessa hipótese, sem dúvida haveria crimes de homicídio culposo, em concurso formal, sendo certo que crimes de dano absorvem crimes de perigo. Mas, como a explosão culposa prevê o resultado morte...

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